Quando era mais nova, meus mestres não me ajudaram muito a gostar de literatura... fui traçando meu caminho à esmo...
Não vou por a culpa toda neles é claro, sei que o sistema em que vivemos, não está ajudando muito um professor de escola pública...
É, eu sei que é triste...mas a situação nesse país, para quem vem de berço humilde não está fácil...principalmente na área da educação..
Mas voltando ao assunto( literatura), como diz o tema acima, irei colocar um poema de Drummond, no começo confesso, que os primeiros poemas que li dele não tinham surtido muito efeito, mas com o passar dos anos(quem lê pode até pensar que sou uma senhora falando desse jeito..rsrs), fui lendo e aprendendo algumas lições que ele escreveu... e que nos faz pensar em tudo em nossa volta...nesse universo maravilhoso...
bom!? Leiam e tirem suas próprias conclusões...
A Suposta existência
Como é o lugar
Quando ninguém passa por ele?
Existem as coisas
sem serem vistas?
O interior do apartamento desabitado,
a pinça esquecida na gaveta,
os eucaliptos à noite no caminho
três vezes deserto,
a formiga sob a terra no domingo,
os mortos, um minuto
depois de sepultados,
nós, sozinhos
no quarto sem espelho?
Que fazem, que são
as coisas não testadas como coisas,
minerais não descobertos__e algum dia
o serão?
Estrela não pensada,
palavra rascunhada no papel
que nunca ninguém leu?
Existe, existe o mundo
apenas pelo olhar
que o cria e lhe confere
espacialidade?
A guerra sem mercê, indefinida
prossegue,
feita de negação, armas de dúvida,
táticas a se voltarem contra mim,
teima interrogante de saber
se existe o inimigo, se existimos
ou somos todos uma hipótese
de luta
ao sol do dia curto em que lutamos.
concretitude das coisas: falácia
de olho enganador,ouvido falso,
mão que brinca de pegar o não
e pegando-o concede-lhe
a ilusão maior, a de sentido?
Ou tudo vige
planturosamente, à revelia
de nossa judicial inquirição
e esta apenas existe consentida
pelos elementos inquiridos?
Será tudo talvez hipermercado
de possíveis e impossíveis possibilíssimos
que geram minha fantasia de consciência
enquanto
exercito a mentira de passear
mas passeando sou pelo passeio,
que é o sumo real, a divertir-se
com esta bruma-sonho de sentir-me
e fruir peripécias de passagem?
Eis se delineia
espantosa batalha
entre o ser inventado
e o mundo inventor.
Sou ficção rebelada
contra a mente universa
e tento construir-me
de novo a cada instante, a cada cólica,
na faina de traçar
meu início só meu
e distender um arco de vontade
para cobrir todo o depósito
de circunstantes coisas soberanas.
(Carlos Drummond de Andrade, A paixão medida,Rio de janeiro,J.Olympio,1980,p.14-16.)